"Ser diferente é normal" - quando a diferença é legal na camiseta, mas não é tolerável no convívio diário.
"Seja você mesmo" - a autenticidade fica bacana estampada num copo e exibida sobre uma mesa, mas é motivo suficiente para eliminação num processo seletivo.
"Anti-social Social Club" - lema bacana bordado na mochila, mas absurdo quando alguém se sente melhor em seu canto, ou trabalhando sozinho.
"Boring people: don't be another one" - sai por aí exibindo isso no casaco ou tatuado no pulso, como se defendesse de verdade o direito à singularidade, mas surta se aparece em sua frente algo que fuja minimamente de sua visão de mundo pré-estabelecida.
(...)
Tive estas reflexões enquanto fazia um exercício para uma disciplina da faculdade denominada Comunicação e Cultura Contemporânea. Todas as frases acima citadas em aspas apareceram de fato em produtos de três ou quatro lojas fast fashion, sendo que estes se esgotaram rapidamente nas vitrines, bancas e e-commerces das marcas. Sei disso porque meu lado paulista da família me fez uma grande fã de shopping centers - inclusive é um hábito que venho tentando reduzir, por razões diversas que podem virar assunto para outra postagem - e as idas em lojas de departamento são uma constante para alguém com baixo poder aquisitivo como eu.
O que me deixou intrigada foi o fato de eu, num belo dia, estar no ônibus com meu "cosplay de secretária", apelido dado por um professor muito querido para se referir às minhas roupas mais sóbrias, e uma mulher, trajando uma camiseta com a frase número 2 citada no início do post em inglês, me olhou torto por eu usar um pentagrama no meu pescoço. Não se deu nem ao trabalho de disfarçar sua ojeriza (ranço, na linguagem corrente e acessível). Como se eu fosse uma pessoa amaldiçoada, sabe? As mesmas expressões de reprovação surgiram quando entrei no shopping para pagar uma conta - vindas de pessoas usando símbolos da "rebeldia". Curioso, não?
Lembrei-me do dia em que uma determinada "brogueirinha" famosa em Salvador e que se dizia minha amiga falou que o meu visual "chamava a atenção das pessoas, mas nem sempre de forma positiva". Isso, apenas porque eu usava brincos grandes em formato de diamantes e uma camiseta com grafites! Para ela, essa poderia ser a razão pela qual eu não conseguia estágio algum. Nesse dia, eu chorei muito (longe de todo mundo, porque até o direito de sentir angústia nos é negado) e tomei a decisão drástica de mudar todo o meu guarda-roupa. Comprei loucamente roupas de tons sóbrios e cortes clássicos, desapeguei de quase todos os meus itens de moda japonesa, desisti do meu cabelo azul, à época. Na esperança de (tentar) me adequar, e me tornar "socialmente aceitável".
Hoje, quase três anos depois, estou sozinha (a menina formou, nunca mais falou comigo e eu nunca mais a vi), sem estágio (meu contrato acabou), sem dinheiro (mudei o guarda-roupa inteiro) e sem a única coisa que me fazia dar um respiro em meio ao surto que está o nosso cenário sociopolítico. Passo meus dias melancólicos enviando currículos em busca de uma nova oportunidade, lendo livros e assistindo a realities shows, meu terceiro guilty pleasure (depois da Coca-Cola e do Tiago Iorc da Cracolândia Afonso Padilha, porque somos nós dois fodidos que sabem rir da própria desgraça), vendo gente com vários estilos sendo admirada e exaltada, usando roupas brilhantes made-in-Wish que todo mundo quer comprar. Mas, por que de longe somos cool e de perto somos fool? É algo, que, de verdade, não consigo compreender...
Cheguei à conclusão de que as pessoas não gostam do diferente, não mesmo. Gostam apenas da emulação da originalidade, de se sentirem vistos e superiores ao Outro. É bastante conveniente, para eles, tomar parte e fazer uso das estéticas anti-sistema/anti-padrão e se banquetear com o semblante "exótico", sem precisar pagar a conta por ser fora da curva. E quando eu falo "fora da curva", não é APENAS por usar uma roupa diferente, mas porque moda sobretudo é expressão e muita gente usa uma moda alternativa como modo de mostrar ao mundo que não está em consonância com o que o Outro nos programou para ser e o modo com o qual a sociedade espera que ajamos.
Resumidamente: nada de errado em quem compra suas "brusinhas" na Liquidação a Preço de Banana com frases de efeito a 70% de desconto. Tudo de errado nessas mesmas pessoas quando querem que o Outro seja igual a elas.
Xoxo,
Xoxo,
Anne
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